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A rotatividade de pregoeiros na Administração Pública

Um importante relatório foi publicado pelo Tribunal de Contas da União, com uma pesquisa realizada com diversos órgãos federais, estaduais e municipais. O objetivo foi identificar o nível de implementação da nova lei de licitações (Lei 14.133/2021) e calcular o Índice de Maturidade na Implementação da Lei de Licitações – IMIL. Entre os resultados da pesquisa, foi identificada a percepção dos órgãos sobre a rotatividade de pregoeiros e agentes de contratação.

A referida pesquisa foi realizada com 1.713 órgãos e entes públicos, na esfera federal, estadual e municipal. O relatório foi aprovado por meio do Acórdão 1.917/2024 – Plenário¹. 

Neste artigo, faço alguns destaques do relatório sobre esse assunto, com alguns comentários.

Rotatividade dos agentes públicos

O resultado da pesquisa mostrou que o maior nível de incidência da alta rotatividade de agentes públicos envolvidos no processamento das contratações ocorreu no âmbito Estadual, com percentual de 61%, seguido do âmbito Federal, com 40%.

O relatório indica ainda que esse resultado é recorrente, tendo sido reportado desde 2018, nos ciclos de acompanhamento de governança realizados pelo Tribunal de Contas da União.

Entre as consequências dessa alta rotatividade, está a escolha de agentes públicos sem experiência e qualificação adequadas, a troca do agente sem o treinamento de um substituto, o baixo desempenho e a ineficiência administrativa.

O documento elenca, ainda, as possíveis causas dessa alta rotatividade¹:

a) a carência, sempre perene, de pessoal nas instituições, justificada muitas das vezes por restrições orçamentárias, o que ocasiona movimentação contínua de servidores para suprir necessidades que se apresentam, bem maiores que o universo de agentes disponíveis;

b) falta de mecanismos para atrair e reter colaboradores na área de contratações, como incentivos;

c) quantidade excessiva de trabalho, especialmente em unidades com poucos agentes públicos, o que pode levar a busca por setores do órgão ou entidade com menor carga de trabalho; e

d) ausência de um Programa de Capacitação Anual ou falta de treinamentos contínuos, o que pode deixar os agentes despreparados para lidar com a complexidade das atividades de licitação e contratos, resultando em frustração, desmotivação e insegurança jurídica. (grifei)

Veja também:  Super Pregoeiro: o faz-tudo

A fuga dos agentes públicos

Essa busca por setores, a fim de sair da área de contratações, já foi objeto inclusive de comentários aqui no Blog, por meio do artigo Super Pregoeiro: o faz-tudo. Os servidores públicos que estão cientes das atribuições do agente de contratação, e que sabem das diversas vezes em que os órgãos de controle já multaram e responsabilizaram esses agentes, vão fugir o máximo possível dessa função. 

Seja por meio de remoções, permutas, transferências, redistribuições, entre outros institutos de movimentação de pessoal, aquele servidor vai tentar sair quanto antes dessa função. Ou seja, existe uma perda real de talentos e bons profissionais.

O medo da punição pelos órgãos de controle, não foi indicada nas possíveis causas pelo Tribunal de Contas da União (um órgão de controle). Porém, no cotidiano dos servidores públicos, em especial de ordenadores de despesas, gestores e pregoeiros/agentes de contratação, esse é um medo real.

Uma pesquisa realizada pela Fundação Tide Setubal² concluiu que esse medo está presente na rotina dos servidores:

Os resultados corroboram a hipótese de que uma percepção mais negativa sobre a atuação dos órgãos de controle está associada a uma maior preocupação com os órgãos de controle no dia a dia da gestão. Ou seja, aqueles servidores que acreditam que os órgãos de controle e auditores têm uma atitude mais punitivista e de pouco suporte também expressam maior medo de ter suas ações e decisões questionadas pelos órgãos de controle.

(…)

Foi identificada também uma leve associação entre a preocupação com os órgãos de controle e o nível de burnout declarado pelo participante. Ou seja, aqueles participantes que informaram ter mais preocupação com os órgãos de controle também relataram níveis mais altos de burnout. É possível que essa preocupação se traduza em maiores níveis de trabalho e estresse, que, por fim, geram maior esgotamento físico e emocional no servidor. Em linha com esse achado, a preocupação com os órgãos de controle também se mostrou levemente associada a uma maior intenção de deixar o emprego, ainda que não tenha estado associada a menores níveis de satisfação no trabalho. (grifei)

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Ou seja, além das causas identificadas pelo TCU, é preciso diminuir a insegurança jurídica e operacional no cotidiano dos pregoeiros e agentes de contratação. Essa mudança também cabe aos próprios órgãos de controle, caso contrário, os servidores honestos e dedicados sairão em busca de uma função menos suscetível à punição dos controladores.  

Incentivos e capacitação

Para evitar essa rotatividade de pregoeiros e agentes de contratação, o próprio TCU indicou que é preciso proporcionar aos agentes públicos incentivos para a permanência na função. 

Seja por meio de incentivos financeiros, como o oferecimento de cargos de confiança e função gratificada, ou por outras formas de incentivo a serem desenvolvidos pelos órgãos públicos.

Contudo, não estou defendendo aqui a concessão indiscriminada de gratificações, mas uma análise racional dos próprios órgãos em propor soluções para diminuir essa rotatividade dos agentes públicos. 

É necessário, também, um programa de capacitação contínuo e efetivo, desenvolvido e acompanhado pela área de pessoal dos órgãos.

A citada pesquisa da Fundação Tide Setubal, é convergente nesse ponto:

Da outra ponta, é também relevante que a administração pública invista em capacitação de seu quadro de pessoal. Apenas 29% dos respondentes apontam que possuem todos os recursos (por exemplo: tempo, conhecimento, apoio técnico e político) necessários para atender bem às demandas dos órgãos de controle.

Portanto, para resolver os (muitos) problemas da Administração Pública, não existem soluções fáceis e simplistas. É preciso um trabalho sério, racional e contínuo.

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Aviso: Minha formação acadêmica não é em Direito, e sim em Administração e Gestão. Sendo assim, não tenho competência para fazer uma análise jurídica. Meu objetivo aqui é trazer a minha interpretação e ensinamentos que obtive após leitura e análise do(s) referido(s) documento(s). Caso queira contribuir com uma análise jurídica, sinta-se à vontade para comentar.

Referências:

¹BRASIL. Tribunal de Contas da União. Acórdão 1.917/2024 – Plenário. Relator: Ministro Benjamin Zymler. Brasília. 18 de setembro de 2024. Disponível em: https://pesquisa.apps.tcu.gov.br/redireciona/jurisprudencia-selecionada/JURISPRUDENCIA-SELECIONADA-173953. Acesso em 09 de dezembro de 2024. 

²LOTTA, Gabriela; MONTEIRO, Vera (Org). O fenômeno do apagão das canetas – efeitos da dinâmica do controle para servidores e para políticas públicas de áreas-fim. Fundação Tide Setubal. São Paulo, 2024. Disponível em: https://fundacaotidesetubal.org.br/publicacoes/o-fenomeno-do-apagao-das-canetas/. Acesso em 09 de dezembro de 2024. 

Leandro Maciel
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